“Computadores fazem arte, artistas fazem dinheiro” |
O movimento de contracultura
que misturava ritmos regionais, como o maracatu, com hip hop, funk, música
eletrônica e rock, e que ficou conhecido, em meados da década de 1990, como Manguebeat,
sob a influência de Francisco de Assis França (Chico Science – 1966 a 1997),
morto num acidente viário há 17 anos, se notabilizou não apenas pela sonoridade
inovadora, mas, principalmente por ser um movimento de cunho social, pois
trazia em suas letras a crítica oportuna ao abandono econômico, social e humano
do homem dos manguezais, derrotado pela desigualdade social reinante na cidade
do Recife, tal qual se agrava em outras cidades brasileiras o desamparo de
categorias de trabalhadores braçais que sobrevivem, por exemplo, da cata e
separação do lixo e são qualificadas como substratos sociais.
A porta voz do manifesto
Manguebeat, intitulado pelo autor Fred 04 de Caranguejos com cérebro, em 1992,
era a banda Chico Science e Nação Zumbi, formada pelo próprio Chico, Fred 04,
Renato L e Helder Aragão, cujo objetivo era criar, a partir da metáfora do
Homem-Caranguejo, uma cena musical tão diversificada quanto os manguezais,
acabando por contaminar outras formas de expressão culturais como o cinema, a
moda e as artes plásticas, influenciando, por fim, muitas bandas de Pernambuco
e do Brasil.
O Manguebeat conseguiu,
ainda, abrir o fechado mercado fonográfico brasileiro, centrado no eixo Rio-São
Paulo, para bandas como Mundo Livre S/A, Sheik Tosado, Mestre Ambrósio, DJ
Dolores, Faces do Subúrbio, Comadre Fulozinha, Jorge Cabeleira, Eddie, Via Sat
e Querosene Jacaré.
Entretanto, o principal componente
impulsionador do Movimento Manguebeat não se restringe a novidade musical do
Maracatu Atômico, e, sim, pelo resgate importante que se fez das ideias do
pensador brasileiro Josué Apolônio de Castro (1908 -1973), mais conhecido por
Josué de Castro, médico, nutrólogo, geógrafo e ativista que dedicou sua vida ao
combate a Fome no Brasil.
Josué de Castro foi um destacado
cientista Político e Social no cenário brasileiro e internacional, não só pelos
seus trabalhos ecológicos sobre o problema da fome no mundo, mas também no
plano político em vários organismos internacionais, como a presidência do
Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO) e, principalmente, pelas obras Geografia da Fome, Geopolítica da Fome,
Sete Palmos de Terra e um Caixão e Homens e Caranguejos.
Josué de Castro fez um inventário
das causas geográficas, culturais, sociais e políticas da avassaladora fome que
ceifava, e ainda persiste ceifando, vidas por todo planeta, agravando os
problemas de saúde e desenvolvimento anatômico e intelectual de bilhões de
pessoas mundo a fora.
E pelas conclusões a que se
chega, pela capacidade produtiva da espécie humana, haja vista o
desenvolvimento tecnológico e o acúmulo de riqueza pelas grandes economias
capitalistas, a questão da fome no mundo encontra suas origens não na
incapacidade de provimento de alimentos para todos, mas, indubitavelmente, na
decisão política dos doutrinadores do mundo de manter superestimado o preço das
Commodities, ainda que pelo sacrifício de multidões de famélicos.
Então, é esse o resgate da
música de Science: fazer ecoar o grito dos ofendidos Homens-Caranguejos, chafurdados
no caminho tortuoso da lama ao caos, para torná-lo visível a uma sociedade
consumista e insensível. Ou seja, o Movimento Manguebeat era, antes de tudo, um
movimento sociológico de resgate da dignidade humana.
Por: Adão Lima de Souza
Quem tem ouvidos que ouça:
do kralho......ze d adaooooooooooo
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirRapaz, eu vim conhecer Josué de Castro um dia desses. Ouvia Chico falar nele, mas, até então, não tinha tido a curiosidade de pesquisar sobre ele. Como diz Science, no documentário "Cidadão do mundo", é uma pena que Josué não seja discutido nas escolas. Enfim, agora resta conhecer a geografia da fome... Quiçá, depois de conhecer a obra de Josué, as músicas do tempo de Chico e, principalmente, as do álbum "Fome de tudo" se aclarem ainda mais.
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