quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Dois poemas anarquistas!

Avante!

Vós que tendes a vida torturada
Pelo jugo mordaz da burguesia;
Vós que horrores sofreis dia por dia
Dessa turba cruel, envenenada;

Vós que a razão sentis amordaçada
Pelo grito brutal da Tirania,
Tempo é já de abater a covardia
E da turba abafar a gargalhada!...

Levantai-vos do charco apodrecido!
Sejai firmes na Grande Trajetória,
Reivindicai o tempo já perdido!...

Avante, ó paladinos do Crisol,
Que além desvendará nossa vitória,
Através da brancura d'outro Sol!...

Antonio Rocha, 01/09/1914


O Amor

Aí tendes o Amor do século pujante,
A portentosa lei que há-de reger o mundo,
Quando o sol, que hoje rompe apenas no levante,
Atingir do zenite o páramo fecundo.

É forçoso que após a morte desastrosa
Das divindades vãs, fantásticas de outrora
Se eleve, como um astro, a crença luminosa
De uma igreja maior, mais forte e duradoura.

Seja pois o universo a Grande Igreja
Onde o novo ritual em pompas de Thabor
Se célebre, e cada um o sacerdote seja,
E cada peito o altar da religião do Amor.

Augusto de Lima, 26/06/2014

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Ferreira Gullar: Poema obsceno


Façam a festa 
cantem e dancem 
que eu faço o poema duro 
o poema-murro 
sujo como a miséria brasileira 

Não se detenham: 
façam a festa 
Bethânia Martinho 
Clementina Estação Primeira de Mangueira Salgueiro 
gente de Vila Isabel e Madureira 
todos 
façam 
a nossa festa 
enquanto eu soco este pilão 
este surdo 
poema 
que não toca no rádio 
que o povo não cantará 
(mas que nasce dele) 
Não se prestará a análises estruturalistas 
Não entrará nas antologias oficiais 
Obsceno 
como o salário de um trabalhador aposentado 
o poema 
terá o destino dos que habitam o lado escuro do país 
- e espreitam.